sexta-feira, 2 de abril de 2010

O Anticristo de Pirapora, por Tadeu Martins

O ANTICRISTO DE PIRAPORA
Tadeu Martins

Ninguém senão Cristo
Resiste ao sofrimento
Ou sofre calado e perdoa
O responsável pelo tormento
Isso eu falo e provo
Acompanhem meu pensamento

Quando chega a Semana Santa
Nas Capitais e no Interior
O povo simples encena
Pelas ruas com muito amor
O sacrifício de Jesus Cristo
Filho de Nosso Senhor

De uma dessas encenações
Eu vou falar agora
Sei que faz bastante tempo
E aconteceu em Pirapora
O moço que me contou
Lembra ano, mês, dia e hora

O vigário arranjou os atores
que foram bem preparados
Jesus Cristo, Madalena, Pilatos
Maria, o bom ladrão e os soldados
todos esses personagens
estavam bem caracterizados

Havia movimento nas ruas
e pro povo não atrapalhar
puseram cordão de isolamento
onde o cortejo ia passar
da porta da Igreja até o calvário
onde a encenação ia acabar

O soldado que batia em Cristo
era o ator Sebastião
que havia entrado na sacristia
antes do começo da procissão
e tomado mais de litro e meio
do vinho do Capelão

Ao invés de representar
ele ia batendo pra valer
e o Cristo reclamava baixo
pro povo não perceber
“Bastião pára com isso
pois tá começando a doer”

Madalena com uma toalha
Limpou o rosto de Jesus
Que reclamou do cansaço
Causado pelo peso da cruz
E pela força das chicotadas
Que estalavam nos ombros nus

Madalena ouviu a queixa
e cochichou com o soldado
“O Chico tá pedindo
procê bater maneirado
senão depois da festa
a barra pesa pro seu lado”

Na subida do calvário
ouviu-se o grito da multidão
foi um tremendo corre-corre
pra presenciar a confusão
Jesus Cristo largou a cruz
e se atracou com Bastião

Trocaram socos e cabeçadas
como lutadores num tablado
veio a turma do deixa-disso
pôs cada um pro seu lado
Bastião perdeu dois dentes
E Cristo não foi crucificado

Tadeu Martins é de Itaobim, no Médio Jequitinhonha. É poeta, cordelista, autor dos livros Viva, meu povo, co-autor de Poetas do Vale e outras publicações.
Vive há mais de 30 anos em BH. Foi um dos idealizadores e fundadores do jornal Geraes, no final da década de 70 e do Festivale - Festival de Cultura Popular do Vale do Jequitinhonha.


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