quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Carnaval, nossa festa coletiva, por Patrus Ananias

Nós, os humanos, temos necessidade do lúdico e do brinquedo. As crianças, quando os adultos deixam, vivem de forma muito saudável essas dimensões. Descubro, aos 60 anos, brincando com meus netos, que trazemos em nós a criança que um dia fomos. Se o infantilismo e a imaturidade emocional constituem perigosos bloqueios e desvios, o espírito da infância, que expressa o alumbramento e a liberdade responsável diante da vida, é um bem que acompanha as pessoas bem formadas. O desenvolvimento das religiões e das artes mostra que os muros da realidade não comportam nossas inquietações e desejos. Melhor que voltemos aos desarmados brinquedos da aurora de nossas infâncias.

O Carnaval nasce dessa necessidade de transcendência do real e das exigências do cotidiano. É o encontro da festa que nos aproxima e irmana com a cultura e com a arte que liberam de forma positiva e civilizatória as nossas dimensões mais íntimas e profundas. Existem teses e textos que querem provar que somos um povo triste. Herdeiros de três raças tristes. Penso diferente. Penso que somos um povo que está construindo sua identidade e, com ela, nossa alegria. Obra prima da literatura brasileira, Grande Sertão, Veredas presta sua referência à alegria: "O que Deus quer de nós é alegria (...) a alegria é o vau do mundo".

Nesse sentido da celebração, algumas manifestações culturais encontram no Brasil uma acolhida e uma adaptação muito especiais. É o caso da música e da dança que inspiram o Carnaval em nosso país. Entre os ritmos que o inspiram e animam, está o samba, seguramente o leito mais acolhedor, expansivo e fecundo da música popular brasileira. O carnaval ganha ritmos regionalizados. Alguns belíssimos, como o frevo, em Pernambuco. Mas é o samba, na sua moldura mais alargada, que nos oferece uma sucessão de músicas antológicas que asseguram a contínua unidade cultural das festas carnavalescas. É ver o espetáculo do desfile das Escolas de Samba do Rio de Janeiro.

Mas é importante lembrar que o samba tem uma dimensão nacional. Vi e ouvi, há poucos dias na televisão, Caetano Veloso reivindicando para a Bahia a origem do samba. E, de fato, a terra em que nasceu e se formou Dorival Caymmi tem muito a ver com ele. Mas segue: Ary Barroso era mineiro; Adoniran Barbosa, paulista. E o samba dialoga com o frevo, o baião, com uma variada gama do cancioneiro popular. Ele possibilitou a bossa nova.

O Carnaval é também a dança e o teatro de rua, manifestações que encontram em Minas um lugar de destaque. Assim, o Carnaval nos expressa e nos redime. Vamos celebrá-lo e contrapô-lo cada vez mais à violência e excessos narcísicos. Vamos nos expandir respeitosamente, fraternalmente, na grande festa coletiva do povo brasileiro.

PATRUS  ANANIAS - Analista Legislativo da ALMG, doutor em filosofia, ex-ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, ex-prefeito de Belo Horizonte e professor da PUC-MG. E-mail:patrusananias@terra.com.br

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