sábado, 29 de outubro de 2016

Diamantina assistirá calada a destruição da educação e saúde públicas?

Serviços públicos mantêm economia de Diamantina
UFVJM é responsável por R$ 204 milhões de injeção na movimentação econômica local.

Marcos Lobato Martins

FIH-UFVJM



O pensador francês Alexis de Tocqueville dizia que uma sociedade democrática precisa de cidadãos de qualidade, isto é, bem informados e orientados por seus interesses bem compreendidos. Na década de 1830, ele ficou positivamente impressionado pelo que viu nos Estados Unidos: as pessoas nas comunidades, a partir de um cálculo simples de utilidade, ajudando-se mutuamente e se dispondo, de bom grado, a dedicar parte de seu tempo aos negócios públicos.


Na América da primeira metade do século XIX, “cidadãos pacatos que, seja por gosto, seja por interesse, desejam sinceramente o bem do país”, colocavam em movimento a maior democracia do mundo. A pedra de toque dessa construção era o interesse bem compreendido: a prática social ordenada na busca (moderada) de seus interesses privados, a identificação racional dos interesses particulares com aqueles da cidadania, o saber sacrificar uma parte de seus interesses pessoais para salvar o bem coletivo. Para Tocqueville, esse modo de entender a relação entre o interesse próprio e o interesse comum reforçaria as ações cooperativas livremente esclarecidas entre os cidadãos, fortalecendo a amizade e a participação.



Esta reflexão me parece fundamental tanto para colocar como para responder a pergunta: por que Diamantina deveria se opor às intenções do atual governo federal que enfileira medidas contra a educação e a saúde públicas?



Pelo Brasil afora, há muita gente criticando e rejeitando as medidas do governo Temer em nome do ajuste fiscal, lesivas aos direitos sociais duramente conquistados pelo povo. Se aprovadas, a Nação perderá. Mas Diamantina tem muito mais a perder do que outras cidades brasileiras, e precisa tomar consciência disso!
Até os anos 1920, Diamantina possuiu economia rica e dinâmica assentada na mineração de diamantes, capaz de fazer dela o “grande empório do Norte”. Nas décadas seguintes, a cidade fortaleceu sua posição como centro administrativo e educacional, utilizando seu passado como meio de impor aos governos estaduais e federais a instalação de repartições públicas numerosas e diversas. Progressivamente, Diamantina virou uma cidade de servidores públicos. Foi graças a isso que a cidade resistiu, sem maiores traumas, ao fim do secular garimpo de diamantes. Hoje, a vida econômica, social e cultural de Diamantina fica quase inteiramente à mercê do funcionamento dos órgãos estaduais e federais aqui sediados. 



Tome-se apenas o caso da UFVJM para se aquilatar o peso que os serviços públicos têm na economia local. Em 2013, o PIB de Diamantina alcançou 563 milhões de reais, dos quais 140 milhões (ou 24,9%) decorrentes dos setores de Administração, Saúde, Educação e Seguridade Social. O orçamento da UFVJM alcançou, em 2013, 204 milhões, praticamente a metade do PIB municipal. Aproximadamente 60% desses 204 milhões foram injetados nos campi de Diamantina. Uma quantidade fabulosa de dinheiro que gera renda, investimento e consumo na cidade! 



Em 2014, havia 4.259 estudantes de graduação e pós-graduação matriculados nos cursos presenciais da UFVJM em Diamantina, 433 docentes e 303 técnicos. Pessoas que contribuem fortemente para sustentar o comércio na cidade. Por isso, todos os empresários locais se queixam do prejuízo que as paralisações de atividades da UFVJM lhes causam. 

Os números do orçamento da UFVJM, apresentados na tabela abaixo, possibilitam avaliar o quanto de dinheiro a universidade já trouxe para Diamantina:

Tabela 1 – Orçamento da UFVJM, 2005-2015 (em mil reais).


[vide imagem abaixo]

É a UFVJM a responsável pela maior parte da renovação, inovação e dinamismo que chegam ao ambiente cultural local. Também foi ela que provocou boa fração do crescimento do setor de serviços (57,4% no período 2005-2009) e nas movimentações financeiras na cidade (22,14% a.a nas operações de crédito; 14,03% a.a. nos depósitos de pessoas físicas; e 8,24% a.a. em financiamentos imobiliários). Foi a universidade que atraiu para a cidade muitos jovens (na faixa etária de 20 a 29 anos, entre os anos 2000 e 2010, registrou-se crescimento de 20%, contra apenas 3% de aumento da população total). Enfim, é graças à UFVJM que, desde 2005, Diamantina ainda se mantém como a principal economia do Vale do Jequitinhonha. E como o polo educacional e cultural mais destacado do nordeste mineiro.


Logo, é do interesse de Diamantina que o governo Temer reduza para 18 milhões o investimento na UFVJM em 2017? 25% do que foi investido em 2011. O custeio será cortado em mais 20%. Além de inviabilizar a universidade, esses cortes não agravarão a situação econômica de Diamantina?

Se se colocar na ponta do lápis as contribuições, em termos de geração direta de renda e empregos, das escolas públicas de ensino básico, da Superintendência Regional de Ensino, da Diretoria Regional de Saúde, dos hospitais que dependem do SUS e dos postos de saúde instalados em Diamantina, não restará dúvida: o futuro da cidade, sua atratividade e seu charme, estão imbricados com a vitalidade da educação e da saúde públicas. 

Quem ataca esses setores, não importa se é PMDB, PT, PSDB ou DEM, ataca o futuro de Diamantina. Quem deseja cortar verbas na educação e na saúde, intenciona apequenar 
Diamantina. É simples assim. O interesse bem compreendido dos diamantinenses não coaduna com o desmonte dos serviços públicos de educação e saúde. 

É hora de dar ouvidos a Alexis de Tocqueville: “O que põe em perigo a sociedade não é a grande corrupção de alguns, mas o relaxamento de todos”.

Não à PEC 241 (do teto dos gastos públicos). Não à MP 746 (da reforma do Ensino Médio). Não aos cortes na Ciência e Tecnologia. Não aos cortes nas Universidades Públicas.

Diamantina, 24 de outubro de 2016.

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